*Por Fábio Guilherme
Antes do advento da Lei 12.015/09, o Código Penal exigia condição especial dos dois sujeitos, ativo (homem) e passivo (mulher), bem como prévia o Crime de Atentado Violento ao Pudor. A supracitada lei alterou o Título VI do mesmo Estatuto Repressivo Brasileiro, que passou a tutelar a dignidade sexual da mulher e do homem, dando uma nova roupagem em especial aos artigos 213 (estupro) e 217-A do CP (estupro de vulnerável ou pedofilia), e os incluiu entre os crimes hediondos, vide art.1˚, incisos V e VI, da Lei 8.072/90. Suas redações passaram a prever a prática das seguintes condutas e penalidades, respectivamente, que: “Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso; Pena: reclusão, de 06 a 10 anos.” e “Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze) anos; Pena: reclusão, de 08 a 15 anos.”. O legislador unificou os crimes do Estupro e do antigo Atentado Violento ao Pudor, elencado no antigo art. 214 do CP, numa hipótese clássica de aplicação do princípio da continuidade normativo-típica. Ou seja, ao invés de se falar em revogação do antigo crime narrado, o que seria um descalabro sem precedentes, aquela conduta apenas migrou para o tipo penal do estupro, com ela fundindo-se. Então, acaso haja conjunção carnal, a conduta influencia tão somente na dosimetria da pena-base do crime em estudo, havendo a ocorrência de um crime único pela prática de qualquer das duas condutas descritas no tipo penal. Não é outro o entendimento da 6ª Turma do STJ ao citar inclusive precedente à época Ministra Convocada do TJ/SE Marilza Maynard, no julgamento do HC 212.305/DF. Portanto, qualquer ato libidinoso, frise-se, desde que respeitado o princípio da proporcionalidade, já se configura no mero exaurimento do tipo penal em comento.
Quando se fala em proporcionalidade, algumas dúvidas inevitáveis surgem acerca de condutas lamentáveis, mas muito atuais principalmente para os usuários de transporte público, como por exemplo: o beijo roubado, o gesto de passar as mãos pelos seios ou nádegas da vítima, a masturbação em público ou em lugar aberto, ou ainda em local que o público tenha acesso, a ejaculação na vítima, configuram-se como crime de estupro? Entendemos que não, para que não haja violação ao princípio em análise, a despeito de entendimento contrário na doutrina. Nestes casos poderemos até vislumbrar a prática da contravenção penal da Importunação Ofensiva ao Pudor (art. 61 da Lei de Contravenções Penais), do Ato Obsceno (art. 233 do CP) ou máximo do Constrangimento Ilegal (art. 146 do CP), a depender de cada caso.
A nosso sentir, apesar de significar um avanço no tocante à dignidade sexual de ambos os sexos, entendemos que a lei poderia ter aproveitado para substituir as expressões que identificam as duas condutas descritas no tipo – conjunção carnal e ato libidinoso diverso da conjunção carnal – por uma expressão que fosse mais abrangente, capaz de englobar ambas, como por exemplo, “violação sexual mediante violência”. Pensamos que esse vocábulo, além da cópula vagínica, também abrange, as relações sexuais ditas anormais, tais como o coito anal ou oral, o uso dos dedos para a penetração no órgão sexual, ou a cópula vestibular, em que não há penetração. Além de englobar as relações homossexuais (tidas, simplesmente, como atos libidinosos diversos da conjunção carnal), tão disseminadas na atualidade.
*Fábio Guilherme Farias – Advogado Criminalista