Aracaju, 24 de abril de 2024
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“A QUESTÃO PREVIDENCIÁRIA”, POR ALBANO FRANCO

Albano Franco (*)

Há quase duas décadas já se vislumbrava o agravamento da questão previdenciária se medidas consequentes não fossem adotadas pelos governos federal e estaduais. As importantes reformas econômicas realizadas no governo Fernando Henrique Cardoso com vistas à estabilidade financeira do país, consubstanciadas no Plano Real, não elegeram o crescimento exponencial das despesas com aposentadorias como uma prioridade inadiável. Criou-se tão somente um redutor no valor das aposentadorias dos funcionários que se aposentavam mais cedo, o tal Fator Previdenciário, ainda vigente. No governo Lula, aprovou-se uma lei obrigando os aposentados a contribuir para a previdência, também ainda em vigência.

O fato é que tais medidas não resolveram a crescente discrepância entre receita e despesa previdenciária ao não se levar em consideração a questão atuarial em face do rápido envelhecimento da população e outras discrepâncias estruturais motivadas por um cipoal de leis, decretos, regulamentos, portarias, etc. que privilegiam determinados estamentos burocráticos em detrimentos de outros e mesmo em relação as aposentadorias do setor privado.
Nesse sentido, o atual regime previdenciário brasileiro é um forte concentrador de renda e inibidor do crescimento da economia, na medida em que 28% do PIB, ou R$ 1,9 trilhão, é gasto com o servidor público em todos os níveis e na previdência pública e privada. Daí a prioridade estabelecida pelo presidente Bolsonaro e seu ministro Paulo Guedes em equacionar essa crucial questão de forma auto ajustável no tempo em consonância com a dinâmica demográfica.

Muito mais difícil do que a União é a situação previdenciária dos estados, especialmente dos menos desenvolvidos, em razão do agravamento econômico ditado pela recessão dos últimos anos que reduziu drasticamente arrecadação do Fundo de Participação, que vem ser a principal fonte de financiamento desses estados. Com poucas exceções, a grande maioria está atrasando salários dos servidores, geralmente acima dos limites prudenciais da Lei de responsabilidade Fiscal e apresentando baixíssimos níveis de investimentos.

Do ponto de vista previdenciário, foram raros os estados que nos últimos anos fizeram mudanças na legislação a fim de mitigar o problema fiscal. Creio que na expectativa de a União resolver o problema, já que no Brasil se espera que o governo central resolva tais questões e com isso não há desgaste político em mexer num assunto que é impopular. Quando governador, em 1998, portanto há vinte anos, consciente de que o problema previdenciário tenderia a se agravar no futuro, com base num estudo atuarial e financeiro realizado por especialistas da Caixa Econômica Federal, encaminhei à Assembleia Legislativa projeto de lei propondo a criação de um fundo, o Funaserp – Fundo de aposentadoria do Servidor Público Estatutário do Estado de Sergipe, a ser financiado pelos servidores, em alíquotas diferenciadas, e pelos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, com o objetivo de, capitalizado, financiar as novas aposentadorias a partir de sua criação. Com o correr dos anos, as despesas com aposentadoria deixariam de ser realizadas pelo tesouro do Estado e passariam a ser feitas pelo Funaserp.

O Fundo foi aprovado pela Lei Nº 4067, de 11 de janeiro de 1999, e em 2006, por uma ação de inconstitucionalidade patrocinada pelo Sindifisco, o Tribunal de Justiça acatou o voto da desembargadora Josefa Paixão propondo a extinção do Funaserp, com base num decreto federal de 1932. O governo da época não recorreu dessa decisão e os recursos capitalizados no montante de R$ 46 milhões foram devolvidos aos servidores e aos cofres públicos.
É evidente que se o Funaserp não fosse extinto a situação previdenciária do Estado seria muito menos dramática e mais confortável. As contribuições e o processo de contínua capitalização iriam prover os recursos para o pagamento de aposentadorias e, com isso, desonerar, em parte, o tesouro do Estado. Com essa finalidade, em 2012, o governo federal criou o Funpresp, que vem a ser um fundo complementar de aposentadoria do servidor federal que guarda estreita similitude com o Funaserp.

Resta, agora, aguardar a proposta previdenciária que em breves dias o presidente Bolsanaro enviará ao Congresso. Que seja profunda e duradoura e que atenda aos anseios de retomada do crescimento econômico do país. Convém, entretanto, lembrar que um considerável lapso de tempo deverá ser demandado para que a economia volte a crescer a taxas elevadas. Outras reformas serão necessárias para que isso aconteça com sustentabilidade.

(*) – Foi governador, senador e presidente da CNI. É Conselheiro Emérito da CNI e membro do Conselho Superior de Economia da FIESP.

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