Aracaju, 25 de abril de 2024
Search

SERGIPE ABRIGA PROJETO INÉDITO DE RECUPERAÇÃO DE TERRAS SINALIZADAS

7

Uma estrada de terra sinuosa leva à propriedade de dona Maria José no semiárido sergipano. Ali, no assentamento Jacaré-Curituba, ela costumava plantar quiabo, milho e feijão. De uns anos para cá, o lote foi ficando sem vida.  A salinização do solo não deixava planta nenhuma crescer. Por isso, quando pesquisadores apareceram por lá dizendo que iriam recuperar a área para que voltasse a produzir, a agricultora não pensou duas vezes, e aceitou a implantação de um experimento piloto de recuperação de solos afetados por sais.

Desde março deste ano, seu pequeno lote sedia um estudo interessante para o Nordeste, a recuperação de solos salinizados. Há muitos deles no semiárido nordestino, por conta de irrigação inadequada associada à má drenagem da terra. O estudo reúne diversas técnicas de recuperação de solos afetados por sais.

Até hoje, as soluções mais estudadas por pesquisadores para resolver o problema foram testadas em laboratórios e casas de vegetação, com pequenas amostras de solo, sendo escassos trabalhos de campo que apontem soluções definitivas quanto à recuperação de solos afetados por sais.  Agora, estão sendo experimentadas diversas técnicas de recuperação em condições de campo, em um solo salinizado pelo uso excessivo de água de irrigação e má drenagem. “A gente está tirando dos livros toda uma teoria e colocando essas informações no campo”, conta o engenheiro agrônomo Airon José da Silva, coordenador da pesquisa. Estamos avaliando deste a escolha dos materiais necessários, até o custo real de recuperação do solo, estas informações serão úteis no fomento de novas pesquisas, na formação acadêmica e para os agricultores que tiveram o solo de seus lotes afetados por sais.

O estudo integra o Projeto Opará: águas do rio São Francisco, patrocinado pela Petrobras, por meio do Programa Petrobras Socioambiental.  As ações são realizadas em parceria com a Sociedade Socioambiental do Baixo São Francisco Canoa de Tolda e a Universidade Federal de Sergipe (UFS).  A principal área de atuação do projeto é o perímetro irrigado Jacaré-Curituba, que abriga cerca de 700 famílias. Algumas delas abandonaram seus lotes por problemas de salinização do solo, como era o caso de dona Maria José.

Para descobrir qual é o método mais eficiente de recuperação da terra, foi escolhida uma área de 1200 metros quadrados na propriedade da agricultora, e a área foi subdividida em seis parcelas. Em cada parcela, está sendo analisado um tipo de tratamento, que envolve basicamente três soluções possíveis em associação: água, gesso e esterco. Ao centro de cada parcela foi instalado um dreno artificial a cada 10 metros de distância e a uma profundidade de 0,4m.

Quem passa por ali e vê os pesquisadores inundando o solo pode ficar confuso. Como é que um problema criado por excesso de água na irrigação pode ser solucionado com água em abundância? Airon explica, do mesmo jeito que costuma falar com os agricultores. “É como se a gente comprasse no mercado uma carne de charque, uma carne de sol, ou um bacalhau. Tem que dessalgar. E aí num primeiro momento eu adiciono água, fervo, jogo aquela água fora.  Depois é que eu vou preparar a carne para comer.  Aqui, é a mesma coisa. É preciso tirar o sal da área”, para só depois fazer o plantio.

A diferença é que essa área agora conta com um sistema eficiente de drenagem. “Antes, foi feita a irrigação, mas não tinha drenagem. A água em excesso evaporou e ficaram os sais no solo, concentrados”. O sistema de drenagem irá tirar o excesso de água e junto vão os sais do solo.

Por isso, num dos tratamentos, só vai água mesmo. Nos demais, há combinações de esterco e gesso. O esterco tem a função de melhorar as condições físicas do solo, e o gesso agrícola de melhora quimicamente o solo, ajudando principalmente na retirada de sódio do solo. Estão sendo avaliadas três doses de gesso (0%, 50% e 100% da necessidade de gesso) com e sem a adição de esterco, totalizando seis tratamentos.

Em junho, os pesquisadores vão voltar ao laboratório para descobrir qual tratamento funcionou melhor, a partir de análises do solo e do lixiviado coletado nos drenos. Mas a prova final será novamente no campo, como não poderia deixar de ser. Em julho, na segunda etapa do experimento, serão plantados milho e feijão, para confirmar qual é, de fato, o método de recuperação mais eficiente. Ou, dito de outro modo, para descobrir em que pedaço de terra a produção crescerá mais vistosa. Vale registrar, que a pesquisa conta, ainda, com a participação dos professores Thadeu Lucas e Rychardson Araújo.

Até novembro, quando acaba o projeto, os pesquisadores vão se reunir com a comunidade para mostrar para os agricultores qual é o melhor jeito de fazer com que os lotes voltem a produzir e qual é o custo desse tratamento.  Este é, aliás, outro diferencial do estudo. “Ao final, nós vamos saber quanto custa, na prática, recuperar um hectare de solo salinizado.  Imaginando que esse valor seja alto, é provável que em alguns casos, como aqui no assentamento, o agricultor precise do apoio de políticas públicas para recuperar esses lotes”.

Para Airon, que é professor da UFS, esse é um projeto que vai além do trabalho técnico-científico. “A gente tem que pensar que o solo é um recurso natural finito, passível de degradação. Deixar esse solo descoberto tende a intensificar posteriormente um processo de desertificação em algumas regiões. Então, recuperar o solo é uma questão ambiental, econômica e social. Afeta a vida de muitas famílias”.

Problema antigo, solução nova

O coordenador do Opará, Antenor Aguiar, conta que desde que começou a trabalhar no semiárido sergipano, e mais especificamente na bacia hidrográfica do rio São Francisco, em 1996, ouve reclamações de agricultores sobre a salinização do solo.

No começo dos anos 2000, ele acompanhou o primeiro diagnóstico destes solos no perímetro irrigado do Califórnia, vizinho do Jacaré-Curituba.  Quando chegou ao assentamento, em 2013, para apresentar um projeto sobre as águas do São Francisco, a comunidade voltou a repetir que um dos seus principais problemas era o sal das suas terras. Agora, finalmente, ele vai poder mostrar o melhor jeito de resolver a questão.  “O Opará é um projeto de cuidar das pessoas, das águas, das matas, das terras”.

Além das pesquisas, o projeto Opará se estrutura em outros três eixos: restauração florestal, educação ambiental e monitoramento.

Fonte e foto assessoria

Leia também