Aracaju, 26 de abril de 2024
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O estilo João com obras e sem liturgias

Diógenes Braynerdiogenesbrayner@gmail.com

Sergipe praticamente paralisou com a morte do ex-governador João Alves Filho. Mexeu com todos os segmentos da sociedade, que se voltou para o reconhecimento do trabalho de um político que mudou o Estado e mexeu com sentimentos de muitos que antes lhe faziam oposição e ainda hoje seguem outros caminhos políticos no Estado.

O que João Alves Filho fez está aí. Todos podem ver, sentir e medir a importância do seu trabalho amplo e que mudou a vida social e econômica do Estado. A sua morte deixa lições. Uma delas é a de que o homem vale pelo que faz por sua gente de forma transparente, correta e extremamente útil para gerações. Esse é o estilo de política que serve de exemplo e faz com que a sociedade jamais esqueça, mesmo que só reconheça depois de um fim triste que, como todos, termina em pó.

A coluna preferiu mostrar de forma parcial como João chegou à política, sem se aprofundar nas dificuldades, rejeição, injúrias e invejas a que se submeteu, de muitos que deseja o poder, apenas pelo poder.

JOÃO CANDIDATO EM 82

A primeira eleição direta aos Governos dos Estados ocorreu em 1982. Estava à frente do processo em Sergipe o ex-governador Augusto Franco (PDS). Três nomes se destacavam para ser o sucessor: senador Passos Porto, prefeito de Aracaju, Heráclito Rollemberg, e o deputado federal Antônio Carlos Valadares.

Paralelamente, o engenheiro João Alves Filho se mostrava interessado em disputar o Governo. Filiado ao Partido Popular (PP), de Tancredo Neves, João Alves não teria apoio do então governador, mas se transformara em uma liderança forte, em razão do seu trabalho como prefeito de Aracaju, na Administração de José Rollemberg Leite. Teria apoio do MDB, que era a legenda de oposição.

Augusto Franco buscava o entendimento para indicar um dos seus aliados e o nome de Antônio Carlos Valadares se sobrepôs aos de Heráclito Rollemberg e Passos Porto. Seria ele o candidato com o aval do então governador.

Entretanto, a popularidade de João Alves Filho chamou a atenção do empresário Albano Franco (PSD), filho de Augusto, que tentaria o Senado Federal. Ao lado de nomes como general Djenal Queiroz, Chico de Miguel e Francisco Passos – lideranças políticas de Itabaiana e Ribeirópolis – do ex-governador José Rollemberg Leite e de outras expressões políticas do Estado, trabalhou para fazer de João o candidato do bloco.

João Alves Filho trocou o PP pelo PSD e com a insistência das conversas, inclusive de bastidores, entre o bloco que o apoiava e o governador Augusto Franco. Houve mudança de ideia: a chapa apresentou João Alves a governador, Antônio Carlos Valadares a vice e Albano Franco ao Senado Federal.

Valadares fora avisado de que seria o vice praticamente às vésperas do pleito e ficou muito irritado. Não recusou, mas deixou clara a sua insatisfação e revelou sua absoluta indignação ao não comparecer à convenção do partido, realizada à rua de Pacatuba, em um prédio pertencente ao ex-deputado Luciano Prado. A ausência do vice provocou certo frisson, embora tudo tenha dado certo ao final. A vitória da chapa foi acachapante, numa disputa contra o candidato de oposição, ex-senador Gilvan Rocha (MDB).

Apesar de a chapa ter sido vencedora em 1982, ocorreu um afastamento do grupo liderado por João Alves Filho dos aliados do senador Albano Franco, que culminou com a demissão de Eraldo Aragão, indicado para a Secretaria da Educação. Paralelamente, João e Valadares se aproximaram da oposição, incluindo segmentos da esquerda, que sempre estiveram em lados contrários ao que pregava, à época, o grupo Franco. A partir daí João se tornou uma liderança política que se elegeu por mais duas vezes governador de Sergipe e prefeito de Aracaju, encerrando sua carreira política ao perder as eleições municipais de 2016 para o atual prefeito Edvaldo Nogueira (PDT)

O POPULAR E O PITORESCO

O engenheiro João Alves Filho inaugurou um novo estilo à frente do Executivo. Foi um dos primeiros a despachar no Olimpio Campos sem protocolos. De camisa de mangas curtas e calça jeans, João atuava para por em prática um novo modelo de trabalho e execução de obras de forma simples, mas que colocasse iniciasse o seu projeto de desenvolvimento, sem ser impactado pela liturgia do cargo.

A sua simplicidade impressionava a população que o conhecia como um cidadão comum. Inicialmente chamava a atenção de quem frequentava o Calçadão da João Pessoa e o via passar, ao seu modo esportivo e sem algum segurança, para comer a feijoada das sextas-feiras no Restaurante da Risomar.

CONTAGEM DE VOTOS

João Alves Filho sempre participou ativamente de todos os pleitos, mas se reservava à leitura e a ouvir clássicos, em seu gabinete do apartamento, durante a contagem dos votos. Deixava os aliados nervosos, mas ele, com tranquilidade, procurava saber apenas o resultado final e comemorava a vitória, mas também entendia a derrota.

QUESTÃO DOS CELULARES

João Alves Filho não tinha hora para ligar aos seus auxiliares. Poderia ser até de madrugada e nos finais de semana, caso surgisse um motivo que levasse a isso. Um desses seus secretários costumava desligar o telefone na sexta-feira e sábado, para evitar chamadas oficiais.

João Alves Filho não fez por menos: presenteou o secretário com um aparelho celular e recomendou: “o seu pessoal pode desligar quando quiser, mas esse que estou lhe dando não desligue nunca”.

SOBRE MOTEL PIRAMBU

Um outro secretário tinha o hábito de desaparecer nos finais de tarde, principalmente às sextas-feiras. Em uma delas, João Alves Filho ligou para tratar de uma pauta com ele e ouviu: “governador, desculpe, não posso ir porque estou em Pirambu”.

Dois dias depois, um outro secretário perguntou ao colega: “Rapaz, onde você estava na sexta-feira à tarde?” Resposta rápido: “Em Pirambu”!

Quem perguntou respondeu: “eu estava com o governador na sexta-feira quando ele lhe telefonou e você respondeu que estava em Pirambu”. E continuou: “João olhou para mim e disse: tenho cara de besta mas não sou. Você conhece algum motel com o nome de Pirambu em Aracaju?”.

REUNIÃO EM DIA DE JOGO

O ex-governador João Alves Filho não se mostrava ligado a eventos, inclusive a jogos e demais festas. Em um dos seus Governos, convocou o secretariado para reunião em plena Copa do Mundo. Pior: com jogo do Brasil.

O pessoal não gostou e tentou uma forma de cancelar o encontro. Conseguiu sem nenhum problema ao anuncia do jogo do Brasil. João até desculpou-se e adiou a reunião.

ROGÉRIO SE SOLIDARIZA

O senador Rogério Carvalho (PT) disse ontem que “Não foi desse jeito que imaginamos fazer a nossa homenagem ao ex-governador João Alves Filho. Mas diante da partida, fizemos questão de eternizar nos registros do Senado Federal a importância deste homem de grande valor. Sergipe é grato por tudo, dr João!”
Manda seu “sentimento e abraço em dona Maria do Carmo Alves, colega e senadora, e a todos os familiares.
Que Deus conforte o coração de vocês”!

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