Aracaju, 6 de maio de 2024
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Ideologia fluida e crise de identidade marcam campanha de Fábio, escreve delegado

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*Paulo Márcio Ramos Cruz

O Partido Social Democrático, do candidato a governador Fábio Mitidieri, deu seu primeiro vagido no dia 27 de setembro de 2011, quando foi aprovado pelo Tribunal Superior Eleitoral. Voraz e fisiológico desde o nascedouro, o PSD nunca se deu ao trabalho de esconder seu único e verdadeiro propósito: o poder pelo poder, mandando às favas qualquer pudor e considerações de ordem moral.

O então prefeito de São Paulo e fundador da legenda, Gilberto Kassab, dizia: “[O PSD] não é de direita, não é de esquerda, nem de centro.” Noutras palavras, poderia se associar tanto à base do Governo quanto à oposição. Apenas para rememorar: o país, à época, estava sob a presidência de Dilma Rousseff (PT) e a oposição era formada por um consórcio liderado pelo PSDB/DEM.

Mais de uma década transcorreu e o PSD continua o mesmo partido fisiológico, adesista e oportunista dos primeiros dias. Exemplo disso é que decidiu manter a neutralidade na disputa presidencial no segundo turno, com exceção da Bahia e Minas Gerais, cujos diretórios apoiarão Lula (PT), ao passo que em São Paulo, onde apoia Tarcísio de Freitas (Republicanos), e no Paraná, apoiará Bolsonaro. Adivinhe qual dos candidatos ganhará em cada um desses estados?

Em Sergipe, apesar de cercado por apoiadores de Ciro Gomes (PDT) e Soraya Thronicke (União Brasil), Fábio, estrategicamente, preferiu pungar na popularidade de Lula, vinculando irregularmente sua imagem à do petista. Provocada, a Justiça Eleitoral proibiu Fábio de usar a imagem do ex-presidente durante a campanha, haja vista que a coligação que representa Lula no estado é liderada pelo também candidato a governador, Rogério Carvalho (PT).

Mas, como todo pessedista que se preza, Fábio vem abusando da fluidez ideológica neste segundo turno. Expulso do vagão lulista por determinação da justiça eleitoral, jogou-se rapidamente nos braços do neobolsonarista Laércio Oliveira, eleito senador pelo PP de Ciro Nogueira. Paralelamente, passou a cobiçar os votos bolsonaristas do espólio de Valmir de Francisquinho (PL), atropelado pela máquina governista no primeiro turno da sucessão estadual.

Dois fatos, porém, repercutidos nas últimas vinte e quatro horas, reforçam essa crise de identidade que bem caracteriza a campanha do candidato de Kassab e Belivaldo. Se bem explorados, tais episódios podem tirar de Fábio preciosos votos conservadores quanto progressistas, na medida em que ambos os segmentos podem se considerar igualmente lesados. E não é para menos.

O primeiro desses fatos foi a ausência de Fábio no evento realizado no último domingo (16), no Centro de Convenções de Aracaju, que contou com a participação da primeira-dama, Michelle Bolsonaro, e das senadoras eleitas e ex-ministras Damares Alves e Tereza Cristina, tendo como anfitrião Laércio Oliveira. Enquanto um Laércio patriota e verde-amarelo até a medula pontificava que “não dá para nós nordestinos e sergipanos sermos rotulados de reduto vermelho”, em um universo paralelo Fábio Mitidieri cantava o hino da Internacional Socialista com os olhos marejados.

O segundo fato veio à tona juntamente com uma denúncia de assédio, coação e perseguição no âmbito de uma secretaria de Estado. Na gravação – feita pelo servidor comissionado vítima de assédio por ter declarado apoio a Rogério Carvalho para o governo -, uma mulher, que aparentemente exerce função de chefia no órgão, afirma em tom categórico que Fábio Mitidieri não apenas não apoia Lula como não admite, em âmbito estadual, qualquer manifestação democrática que não seja em seu favor.

Não é de admirar que, com essa coletânea de incoerências, Fábio só tenha passado para o segundo turno em razão de um tropeço da justiça eleitoral. Mas não será dessa vez que a máxima evangélica de que ninguém pode servir a dois senhores deixará de incidir em um caso concreto.

*Paulo Márcio Ramos Cruz é Delegado de Polícia e foi candidato a prefeito de Aracaju em 2020

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