Aracaju, 11 de maio de 2024
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Com quatro décadas de carreira, Angela Ro Ro ganhou notorietade não só pelos seus sucessos, como pelas notícias de sua vida intensa e suposta personalidade explosiva

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A própria Angela Ro Ro está à cargo de sua agenda de imprensa e dos seus compromissos profissionais. Foi o que descobri quando ela mesma agendou uma conversa por telefone comigo uma hora depois de eu ter feito uma solicitação de entrevista, na tarde de terça-feira (14).

Começamos o bate-papo falando de suas expectativas para se apresentar no sábado, às 18h, na Virada Cultural de São Paulo, no palco da Barão de Limeira. O show terá no repertório muitas canções de seu primeiro álbum – lançado em 1979  -, assim como composições de outros discos “que as pessoas gostam de ouvir” e “muito blues e rock”, nas palavras da própria.

“Um evento como este é muitíssimo importante e de total necessidade para trazer o público à obra e ao artista. E nem falo de um público de outra geração só. Pode ter gente lá com a minha idade que nunca tenha prestado atenção no meu trabalho”, acredita.

Com quatro décadas de carreira, Angela ganhou notorietade não só pelos seus sucessos (Amor, Meu Grande Amor; Gota de Sangue; Só Nos Resta Viver…), como pelas notícias de sua vida intensa e suposta personalidade explosiva, que ela faz questão de refutar.

“Ninguém me conhece de verdade. Nem os meus pais, que faleceram, me conheciam. Por isso que eu nunca deixaria uma pessoa escrever uma biografia minha. Se eu deixasse, ela iria se basear em que? Seria uma repetição de notícias sensacionalistas e escândalos”, afirma.

Longe das drogas e do álcool desde 1999,  ela acredita que as notícias que falavam sobre seu vício a prejudicaram desde o início da carreira. Se assumir lésbica na década de 1980, em uma sociedade mais conservadora, também teve consequências, segundo ela.

“Destruíram metade das minhas chances de fazer dinheiro e sucesso com escândalos e calúnias. Se tem gente que insiste que eu seja símbolo de escândalo nacional, que eu seja uma coisa horrorosa, que achem. Estou cagando e andando. Não quero admiração de quem não merece meu respeito”, diz ela, totalmente aversa ao ‘politicamente correto’, como demonstra em seu perfil aberto no Facebook quase sempre que emite uma opinião.

“Acho interessante ser incompreendida. Não vou ficar pensando no que devo ou não falar”, diz.

Apesar de confirmar que viveu grandes amores, entre eles com a cantora Zizi Possi, ela afirma que a fama de pegadora estava distante de sua realidade. “Eu era pura fama! Sou tímida e tinha essa timidez na mocidade. Eu namorei mulheres maravilhosas e tive chances maravilhosas, mas na hora do sexo, saia correndo”, relembra.

Perto de fazer 70 anos, Angela conta que aprendeu a curtir o sexo na terceira idade. Atualmente em um relacionamento, ela se diz apaixonada e feliz na cama. “Agora estou amando, namorando e funcionando! Acho interessante que durante a mocidade, quando todo mundo me queria, eu não conseguia. Agora na terceira idade, estou me revelando e me entendendo. Escuto gente com 50 e poucos anos falando que está fechada para balanço. Tem gente que não quer mais sexo! Eu sou meio do contra. Comigo está acontecendo o contrário. Só não sei até quando isso vai ser assim”, diverte-se.

Angela credita a vitalidade e jovialidade ao seu jeito de ser exagerada, “assim como na música do Cazuza”. “Eu continuo jovial, talvez por manter esse exagero e essa afobação do jovem. Sempre fui muito intensa em tudo que fiz, mas com uma intensidade que tinha uma fugidinha para ironia, que é um forma de humor.”

A cantora também se diz animada com a carreira musical. Seu último álbum de estúdio foi Selvagem (2017), mas garante que compõe toda hora. Também está escrevendo um livro, que pretende lançar no ano que vem, “desde que não me pressionem”. Caso contrário, ela jura, não vai torná-lo público.

“Não sei se faço uma biografia ou uma miscelânea de poesias, crônicas de safadezas e erotismo de bom gosto e comedido. Mas acho que vai ser bem lúdico. Vamos ver se até o ano que vem ele sai”, adianta.

Aposentadoria? Não enquanto ela tiver sua voz forte e disposição. “Fumei desde adolescente até os 49 anos. Faz 20 que parei. Dou graças à vida porque tenho muita sorte, fôlego e uma voz forte. Tendo o aparelho físico funcionando, o tesão pela arte não vai passar. Eu não pertenço à música, eu pertenço à poesia.”

INSPIRAÇÃO PARA COMPOR
“É praticamente dentro de mim a mesma coisa. Tenho uma essência muito constante. Ainda bem que gosto dela e convivo bem com ela. Não tenho fases! Desde que nasci sou a mesma coisa. A gente vai pegando conhecimento e perdendo outros, mas a essência é totalmente minha. O que eu fiz no meu primeiro disco, faço hoje com a mesma intensidade. Minhas composições são de observação de sentimentos e fatos. Apesar da raça humana não ser exemplo de beleza, sou muito interessada nela. O animal mais estranho, complexo e doentio é o humano. Sempre falo sobre a vida e de forma intensa.”

AVERSÃO AO POLITICAMENTE CORRETO
“A gente não pode mais falar certas coisas, né? Não levo isso a sério! Acho interessante ser incompreendida. Não vou ficar pensando no que devo ou não falar. Sempre falei para amigos: ‘Meu caboclinho, venha cá’. É um jeito carinhoso. Não vou deixar que a censura mundial me impeça.”

POLÍTICA ATUAL
“Me recuso a ser resenhista política. Não vou querer comparar o cenário atual com a época em que eu tinha 20 poucos anos e o Brasil passava por uma revolução militar, que não foi a primeira e não será a última.”

INTOLERÂNCIA DE GÊNERO E DE ORIENTAÇÃO SEXUAL
“Infelizmente a gente está vendo comportamentos de excessos e exuberância de violência no mundo inteiro, especialmente de forma covarde contra mulheres, trans, idosos… Eu entendo esse medo que os gays, lésbicas e trans passam, mas nunca tive medo de sair na rua. Os loucos não temem! Mas quem vê o que está acontecendo com o planeta, não pode jamais querer pertencer a esta sociedade. Prefiro ser eternamente desajustada a esse inferno. Não quero me unir a uma sociedade assassina e covarde. No dia em que eu for aceita, vou me sentir assassinada.”

REPRESSÃO POLICIAL
“Já apanhei muito da polícia civil e militar. Não enxergo direito em um dos meus olhos. Fiz duas operações para tentar corrigir isso. Quase fiquei paralítica! Fui agredida gravemente pelo serviço público que a gente paga. É aquela questão da boçalidade nos cargos de poder. Meu pai foi polícia federal. Ele era um homem importante, que nunca usou uma arma. Ele mostrava sua autoridade com uma caneta e dizia: ‘Essa aqui é minha arma’. Com ela, ele penalizava, punia, investigava… Fui criada por um homem de muita virilidade, que nunca teve a mania de coçar a braguilha da calça ou outras coisas do tipo.”

Fonte/Foto: globo.com

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