Aracaju, 29 de março de 2024

“Quem julga as pessoas não tem tempo para amá-las” – A história de amor e orgulho de uma mãe

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“Quem julga as pessoas não tem tempo para amá-las”, essa frase dita por Madre Tereza de Calcutá foi reproduzida com muita ternura e generosidade por Maria Luiza dos Santos, uma mulher e mãe que há três anos executa a função de serviços gerais no setor administrativo da Secretaria de Estado da Saúde (SES).

Sempre atenta às suas atividades, Luiza navega por todos os setores do complexo da SES, como uma desbravadora que todo dia espera encontrar algo que lhe encha o coração de felicidade. Por onde passa distribui educação, bom humor e empatia. O setor administrativo, que funciona de maneira integrada, sem paredes  físicas entre os departamentos, formam um grande arquipélago composto de ilhas que se complementam. O transitar poderia ser um desafio para o seu corpo de 57 anos, mas para quem  possui alma leve, alimentada por uma sabedoria herdada da vida, trabalhar se torna uma rotina prazerosa.

A comunicativa Luiza ainda tem o presente de, entre a organização de uma ilha e outra, cruzar com duas das suas cinco “crias” que também trabalham na Secretaria de Saúde: Leonardo Dorneles e Isabela Aparecida. O filho de Luiza exerce a função de Encarregado de Serviços e a filha, assim como a mãe, atua como Serviços Gerais. Além dele e dela,  Luciano Dorneles, outro filho de Luiza e a esposa dele, Monique, trabalham no Hospital da Polícia Militar do Estado de Sergipe (HPM) que é de responsabilidade da SES.

Esta matéria especial vem a desvelar não somente o orgulho que Luiza, Isabela, Leonardo, Luciano e Monique carregam em trabalhar na rede de Saúde do Estado de  Sergipe, explicita, sobretudo, o orgulho que possuem em pertencer a uma família repleta de singularidades, composta por identidades diversas. Uma pluraridade de possibilidades de ser e de viver que estão contempladas na sigla LGBTQIA+:  Isabela é uma mulher lésbica, Leonardo é um homem gay,  Luciano é um homem trans e Monique, esposa de Luciano, não gosta de rótulos.

Luciano tem tatuada no ombro a palavra “resiliência”, que pode ser traduzida como a capacidade de se regenerar após grandes mudanças. Ele integra a equipe do HPM como Auxiliar Administrativo e compartilhou com felicidade um pouco da sua trajetória profissional e pessoal. “Eu comecei a minha transição aos 35 anos quando fiz a mastectomia. O que dói mais para uma pessoa transgênero é a aceitação de si e do outro, principalmente, dos pais. No trabalho, em relação ao meu gênero, a minha coordenadora sabe. Eu não sei se as demais pessoas sabem também, porém, nunca me olharam de maneira diferente, muito pelo contrário, me acolhem. O bem maior para mim, nesse momento de pandemia, não é saber o que as pessoas pensam sobre a minha identidade de gênero, o que me engrandece é ter a certeza que eu faço parte e posso ajudar da melhor maneira possível”, relata Luciano.

Ele explica que tem atuado de maneira muito intensa no auxílio de fisioterapeutas e médicos no HPM. “O Hospital que eu trabalho é exclusivo da Covid-19, então, é engrandecedor poder contribuir para atender pessoas fragilizadas por um vírus a que todo mundo está exposto. A minha gestora me dá a liberdade de correr atrás de equipamentos, insumos e essa possibilidade de trabalhar para ajudar pessoas é revigorante”, fala Luciano com paixão pela profissão.

Para Monique que atua como fisioterapeuta, também no HPM, a sua função é fundamental no atendimento dos pacientes assistidos pelo hospital. “Dizem que um hospital só funciona se tiver médico, mas no presente contexto, a presença do(a) fisioterapeuta é essencial. Hoje a gente está aí na linha de frente… Ver pessoas enfrentando essa batalha e estar ajudando elas a superar é muito gratificante”, reitera Monique. Em relação à sexualidade afirma que colegas de trabalho sabem e que nunca foi vítima de preconceito.

Sempre ao lado de Luiza durante a entrevista, Isabela fala timidamente sobre o processo de entendimento da sua sexualidade. A jovem, que num primeiro momento vivia uma bissexualidade, diz não recordar de ter falado com a mãe sobre o assunto e explica que suas descobertas se deram de forma natural. “Hoje eu me considero Lésbica. Para mim não foi difícil, mas foi meio complicado para minha mãe assimilar de início, pois, já tinha Luciano e Léo”, relata de maneira bem humorada.

Ao contrário do que aconteceu com Isabela, para um dos filhos de Luiza, a auto aceitação não foi tão simples. “No início eu não me aceitava, mas com o passar do tempo eu fui compreendendo que a minha felicidade estava em primeiro lugar. A aceitação da minha mãe foi melhor do que eu imaginava. Eu pensava que ela iria me crucificar, mas ela me acolheu e era justamente o que me importava, minha mãe me aceitando eu não estava nem aí para o que as outras pessoas iriam achar”, fala Leonardo de maneira enfática.

Leonardo explica que trabalhar na SES junto com sua mãe e irmã é uma experiência nova, afinal, ele exerce a função de chefe. “Aqui a gente tem uma convivência como profissionais e em casa somos família, é diferente uma coisa da outra”, destaca.

Em todos os relatos foi possível verificar que o acolhimento de Maria Luiza fez toda a diferença na consolidação das identidades dos seus filhos e filhas. “O que foi que Deus pregou no mundo? Ele não pregou o preconceito. A  maior potência do mundo é o amor, não tem outra maior não. O que fala mais alto é o amor e o acolhimento é tudo”, expõe Luiza.

Luciano descreve a sua família como sendo ‘pouquíssimo tradicional’. “Somos em cinco e dentro desses cinco cabem sete cores, as cores do arco-íris. É uma família alegre em todos os aspectos, isso graças ao elo de amizade, de amor, de carinho que se fez entre nós irmãos e nossa mãe”, expõe emocionado. Ele e Monique mandam um recado para todes  neste dia 28 de junho, data em que se comemora o  orgulho LGBTQIA+: “Saiam dos armários e ganhem seus espaços, ou melhor, quebrem os armários. Todos somos dignos de estarmos onde quisermos!”

Os quatro trabalhadores da saúde já tomaram a primeira dose da vacina contra o coronavírus e afirmam que também estão vacinados contra outro vírus que ainda anda solto na sociedade: o preconceito. O imunizante contra esse mal que tenta impedir a existência de tudo o que é considerado diferente é a coragem, essa que empodera e autoriza pessoas LGBTQIA+ a serem o que nasceram para ser e viverem o que nasceram para viver.

“Eu me orgulho dessa família, meus filhos e filhas… E quem quiser que mexa com eles”, fala Luiza transbordando todos os sentimentos que cabem no coração de uma mãe.

Notas do repórter

Eu, na condição de repórter e narrador desta matéria que você acabou de ler, poderia contar a história de Luiza, sua filha, nora e filhos por várias perspectivas, afinal, vivência não falta às nossas personagens. Porém, escolhi apresentar essa inspiradora família a partir de uma ótica que impacta diretamente a minha própria existência, afinal, eu sou um homem cisgênero, gay que assim como Isabela, Leonardo, Luciano, Monique e tantos LGBTQIA+, vive em um muito ainda repleto de desamor e intolerância.

Escrevo essa matéria especial ocupando meus lugares de fala para amplificar vozes que clamam por respeito, dignidade e direitos. Na área da saúde somos muitos, trabalhando bravamente em várias funções, todas elas complementares e de extrema importância. Na pandemia, com otimismo e garra, saímos todos os dias de casa pensando em realizar nossos trabalhos com qualidade, sabendo que podemos fazer a diferença na vida das pessoas. E quando saímos para realizar os nossos ofícios, as nossas identidades de gênero e sexualidade vão junto conosco porque são partes indissociáveis de nós.

Quando cuidamos das pessoas é o nosso todo que se doa e fazemos isso com toda a generosidade e respeito que almejamos receber de volta da sociedade. E para mostrar que é possível conseguir isso num mundo ainda tão repleto de intolerância e violências, eu resolvi ser porta-voz desse exemplo de amor incondicional vivenciado por essa família trabalhadora da SES.

Escrevo esse texto  especial como quem finca com orgulho uma bandeira do arco-íris no topo de uma montanha, para que outros iguais a mim possam se reconhecer e compreender que não estão sós. São narrativas como essa que oportunizam à comunidade LGBTQIA+, renovar as crenças num mundo melhor, no qual o tempo que ‘nos foi dado viver sobre a terra’ seja gasto com a prática do amor e ponto final.

Fonte e foto SES

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