Aracaju, 29 de abril de 2024
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O erro médico e sua responsabilização criminal, escreve advogado

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*Fábio Guilherme

Tema sempre em voga, sobretudo após a veiculação maciça do procedimento estético mal sucedido realizado pelo médico Dênis Furtado, que culminou com a morte da bancária Lilian Calixto, de 46 anos, em julho desse ano, o erro médico é responsável por 06 mortes por hora no Brasil (fonte: Revista Galileu, edição de agosto de 2018).

Sem sombra de dúvida a medicina é uma profissão eminentemente relacionada ao risco, fato que vem desencadeando inúmeros conflitos no campo jurídico, em razão de uma pluralidade de circunstâncias geradoras, as quais indicá-las nos levaria seguramente à exaustão. É inequívoco afirmar que, muitas dessas questões jurídicas envolvendo o tema em comento transitam pela violação de deveres ético-jurídicos inerentes à profissão.

A responsabilização médica por atuação inadequada pode envolver mais de uma esfera jurídica. Assim, não é incomum que a prática de um único ato ilícito no exercício da medicina possa desencadear consequências nas esferas administrativa (ex.: cancelamento ou suspensão do CRM), cível (ex.: pagamento de indenização por erro médico) e criminal (ex.: punição por lesões corporais graves em uma cirurgia estética mal executada, homicídio culposo ou até mesmo doloso).

Entretanto, ressaltamos que o exercício da medicina é uma atividade meio a exceção da cirurgia estética, trata-se de atividade fim, ou seja, nem sempre os resultados esperados serão alcançados através da intervenção médica. Em contrapartida, porém, espera-se que a atuação do profissional esgote todos os meios possíveis para que os fins sejam atingidos, de modo que nem sempre a ineficácia no serviço prestado possui qualquer repercussão na esfera penal, sendo necessária a análise, em um primeiro momento, do nexo causal entre a conduta do profissional da medicina e o resultado típico –  relevante penal.

Esse nexo de causalidade consiste numa relação de causa e efeito, sendo adotado o critério da imputação para atribuir um resultado típico ao médico. Em outras palavras, para que um resultado seja típico deve ser causado e imputado ao médico.

Nessa linha de raciocínio, a fim de evitar uma responsabilidade penal objetiva, vedada pelo Direito Penal, tudo o que não for compreendido dentro das possibilidades reais da atividade médica não pode ser atribuída ao médico, por exemplo:

“Não caracteriza erro médico o diagnóstico de faringite em menor que vem a falecer, após a constatação de meningite, não só pela possibilidade de evolução de um quadro clínico para o outro, cujos sintomas se revelaram posteriormente, já no seio familiar, como, ainda, pela ausência de condições materiais do posto de saúde, de uma cidade do interior, para realização de exames mais detalhados” (TA/PR –ApCrim 189.649-9, Rel. Airvaldo Stela Alves, Julg. 5.9.2002)

Constatado o nexo causal entre a conduta do profissional da medicina e o resultado típico e podendo ser a ele imputado, necessária será a análise do elemento subjetivo dolo ou culpa, em sua conduta (art. 18, I e II do Código Penal).

O dolo restará caracterizado quando houver a intenção do profissional em lesar ou matar o paciente. Já a culpa, envolve a lesão a um dever objetivo de cuidado, que pode advir em 03 hipóteses: imprudência, negligência ou imperícia. Nada obsta que haja a presença cumulativa de duas delas ou mesmo das três.

Destaque-se, ainda que, riscos imprevisíveis ou decorrentes da própria evolução natural do tratamento ou da doença elidem a responsabilidade criminal, por não se adequarem a qualquer modalidade de infração penal culposa. Da mesma forma, é possível que se adentre ainda no campo dos denominados erros escusáveis, ou seja, aquele que qualquer médico, nas mesmas circunstâncias e com os conhecimentos regulares, não teria como evitar.

*Fábio Guilherme Farias, advogado criminalista

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