Aracaju, 24 de outubro de 2025
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O LUGAR DA MULHER TAMBÉM É NO JUDICIÁRIO: DISPUTA DO 5º CONSTITUCIONAL EM SE GANHA PROTAGONISMO FEMININO

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Em mais de nove décadas de existência da Ordem dos Advogados do Brasil em Sergipe (OAB/SE), nenhuma mulher chegou ao Tribunal de Justiça do Estado pelo Quinto Constitucional. Também jamais uma advogada presidiu a seccional sergipana. Agora, esse cenário começa a mudar. Pela primeira vez, mulheres despontam entre os principais nomes na disputa pela vaga destinada à advocacia, um marco na luta por representatividade e equidade de gênero no sistema de Justiça.

A Constituição Federal estabelece que um quinto das vagas dos tribunais seja preenchido por advogados e membros do Ministério Público. Criado para garantir pluralidade e oxigenação das cortes, o chamado Quinto Constitucional, na prática, tem favorecido historicamente os homens. Em Sergipe, o mecanismo reflete a estrutura de poder masculina que domina o Judiciário desde sua origem.

Neste ano, a presença de três mulheres chama a atenção, Marília Menezes, Carla Caroline e América Nejaim, transforma a disputa em um movimento simbólico de reconstrução. Elas representam trajetórias distintas, mas convergentes na defesa de uma Justiça mais inclusiva e plural.

Um marco inédito

A possibilidade de uma mulher chegar ao Tribunal de Justiça de Sergipe pelo Quinto Constitucional tem dimensão histórica. Nenhuma advogada havia sequer figurado entre as favoritas nas listas anteriores. O avanço reflete uma nova geração da advocacia sergipana, que passou a exigir espaço e reconhecimento.

O fenômeno local conecta-se a um movimento nacional mais amplo. Em 2018, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) criou a Política Nacional de Incentivo à Participação Institucional Feminina no Poder Judiciário, por meio da Resolução nº 255. A medida obriga tribunais a adotar ações que estimulem a presença de mulheres em cargos de liderança e comissões.

Um estudo recente publicado na Revista de Gênero, Sexualidade e Direito, assinado por Larissa Bastos Rodrigues e Oswaldo Pereira de Lima Júnior, analisa o impacto dessa política. O artigo aponta que, embora as mulheres sejam maioria nas faculdades de Direito e tenham avançado em cargos técnicos, ainda enfrentam barreiras estruturais, o que os autores chamam de “patriarcalismo jurídico”.

Segundo o estudo, a presença feminina em tribunais não é apenas questão simbólica, mas contribui para decisões mais pluralizadas e democráticas. “O Judiciário se fortalece quando reflete a diversidade da sociedade que julga”, afirmam os pesquisadores.

Para a professora Luciana Ramos, da FGV Direito SP, “a representatividade feminina nas instâncias superiores é um passo essencial para consolidar a democracia substantiva, que se faz também pela inclusão”.

Marília Menezes: liderança com resultados concretos

Entre as candidaturas femininas, Marília Menezes simboliza a consolidação de uma liderança institucional construída a partir do trabalho. Advogada há mais de 15 anos, procuradora do município de Lagarto e primeira mulher a presidir a Associação dos Procuradores Municipais de Sergipe (APMSE), ela ficou conhecida por uma gestão de resultados à frente da Caixa de Assistência dos Advogados de Sergipe (CAASE) entre 2022 e 2024.

Sob sua direção, a CAASE implantou o kit maternidade e a creche para as advogadas deixarem seus filhos, criou salas de acolhimento para mulheres vítimas de violência e desenvolveu programas de saúde mental voltados à advocacia. Também interiorizou serviços, levando a instituição a regiões antes desassistidas. Marília representa a mulher preparada, que une técnica, empatia e visão institucional.

Carla Caroline: voz da mulher negra e da inclusão

Defensora pública e militante dos direitos humanos, Carla Caroline traz para o debate a pauta da diversidade racial e de gênero. Sua candidatura representa o ingresso de um olhar ainda mais plural sobre o sistema de Justiça, um espaço em que apenas 19% das magistradas se declaram negras, segundo dados do CNJ.

Carla Caroline ressaltou que o edital traz inovações importantes voltadas à pluralidade e à representatividade dentro da categoria. Entre elas estão a paridade de gênero, a reserva de 30% das vagas para pessoas negras e 10% para pessoas com deficiência, tornando o processo mais inclusivo e democrático.

Com trajetória marcada pela defesa da igualdade racial e pelo enfrentamento à violência contra a mulher, Carla afirma que a representatividade não é concessão, mas direito. Sua presença na disputa simboliza a necessidade de que o Judiciário reflita a diversidade social do país.

América Nejaim: experiência e compromisso com a formação

Com mais de 25 anos de docência, a advogada, jurista e professora América Nejaim é referência na formação de novas gerações de advogados. Representa o olhar técnico e pedagógico da advocacia, reforçando que a presença feminina também se constrói por meio do conhecimento e da ética profissional.

Sua trajetória acadêmica reforça a importância de valorizar o preparo e o mérito como bases para a equidade de gênero dentro do sistema jurídico.

Texto e foto: Humberto Jr.

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