Sem o cuidado, a economia para, pois é o cuidado que mantem a vida. Os sujeitos da política de cuidados são bebês, crianças e adolescentes, pessoas idosas, pessoas com deficiência e trabalhadoras/es do cuidado remuneradas/os e não remuneradas/os, mas com responsabilidades familiares de cuidado invisibilizadas e socialmente desvalorizadas.
Para escrever uma nova história sobre o trabalho do cuidado com a responsabilização do estado e de toda a sociedade, o Seminário Estadual da Política Nacional do Cuidado, realizado na UFS, pela mandata da deputada Linda Brasil (Psol), dedicou a manhã e a tarde da segunda-feira, dia 10 de novembro, para discutir sobre o tema.
A Lei 15.069/2024 que institui a Política Nacional de Cuidados e o Decreto 12.562/2025 que institui o Plano Nacional de Cuidados foram pontos de partida neste importante debate.
Presente na atividade, a atual secretária Nacional de Autonomia e Política de Cuidados do Ministério das Mulheres, Rosane da Silva (PT), é uma trabalhadora CUTista que já integrou a direção nacional da Central Única dos Trabalhadores (CUT), e há muitos anos luta por este momento.
“As mulheres são grande parte da classe trabalhadora. Pensar com a classe trabalhadora é também pensar na perspectiva das mulheres, sobre as demandas das mulheres. Sempre debatemos muito esse assunto, por isso o momento é histórico, porque começamos agora a oficializar essa política pública tão necessária para garantir a nossa autonomia econômica, social e política”, declarou Rosane da Silva.
Como o Estado brasileiro nunca tomou este tema como uma responsabilidade também sua, essa conquista feminista é fundamental e vai beneficiar toda a população brasileira, além de interferir nos direitos da mulher de forma ampla. “Enquanto nós mulheres estamos gastando tanto tempo realizando esse trabalho de cuidado, são os homens que estão na política em sua maioria decidindo a respeito de nossas vidas”, alertou a secretária Nacional de Autonomia e Política de Cuidados.
A deputada Linda Brasil citou o IBGE para informar que, em 2023, 2,5 milhões de mulheres brasileiras deixaram de trabalhar para cuidar de parentes ou de tarefas domésticas. De acordo com a Organização Internacional do Trabalho (OIT), as mulheres ocupam 3,2 vezes mais tempo com tarefas do cuidado do que homens.
“Quem cuida, na maioria das vezes, são mulheres negras, pobres e periféricas. São elas que sustentam o cuidado com o seu trabalho. Seja o trabalho remunerado, precarizado e desvalorizado; seja o trabalho não remunerado, aquele que recai como uma obrigação familiar e invisível. São elas que sustentam com seus corpos e com seu tempo o funcionamento da sociedade”, explicou Linda Brasil.
Vozes do Cuidado
Após a abertura do Seminário, ‘Vozes do Cuidado’ foi o tema da palestra de Quitéria Santos (SINDOMÉSTICA/CUT-SE) e Ivonete Cruz (CUT/CNTE). Junto a elas, também fizeram parte da mesa de debate Andréia Teixeira (Coletivo de Mulheres Negras Rejane Maria), Vaneide Dias (Coletivo de Mães Atípicas) e Maria Eliete MOTU (Movimento de Trabalhadoras/es Urbanas/os).
“Foi a Fenatrad (Federação Nacional das Trabalhadoras Domésticas) que despertou o Brasil para a urgência do debate sobre a política de cuidados. Na pandemia, todo mundo fazia trabalho online, mas não tem como você ‘lavar um banheiro online’, fazer comida, lavar e passar roupa online, arrumar a casa. Então o trabalho doméstico continuou sendo presencial mesmo. E muitos patrões não cuidaram da saúde da trabalhadora doméstica. Isso fez com que a primeira pessoa a morrer no Brasil de Covid foi uma trabalhadora doméstica, contaminada pelo patrão, no Rio de Janeiro. Então a Fenatrad lançou a campanha: ‘Cuida de quem te cuida’”, afirmou Quitéria Santos, durante sua palestra.
A luta pelo direito à creche foi outro ponto presente no debate da política de cuidados que, entre as ações que já estão sendo implantadas, estão previstas a universalização do acesso à creche, a construção de cuidotecas e lavanderias comunitárias.
Membro da Direção Nacional da CUT e da CNTE (Confederação Nacional dos Trabalhadores da Educação), a professora Ivonete Cruz reforçou a necessidade de que haja uma política de financiamento público sólida para a política do cuidado se efetivar.
“Lutamos há mais de 10 anos pela aplicação de 10% do PIB na educação pública brasileira. Isso estava previsto no Plano Nacional de Educação. E hoje nos deparamos com uma tentativa de retrocesso com alteração na proposta de financiamento da educação. Não podemos aceitar que a destinação de recurso público para a educação pública seja de 7,5% e 3,5% para a educação privada. Sem recurso, como vai acontecer o cuidado? O centro do cuidado da criança passa pela creche, passa pela escola em tempo integral com projeto pedagógico que prepare o jovem para a Universidade, passa por uma escola inclusiva para a criança com deficiência. Creche não é lugar de amontoar criança, é lugar de socialização, de educação infantil. Para isso acontecer, é preciso de orçamento. Sem mais investimento, não vai ter mais política pública”, discursou a professora Ivonete Cruz.
Outro ponto importante na palestra da professora Ivonete Cruz foi a luta contra a Reforma Administrativa que tramita no Congresso Nacional através da Proposta de Emenda Constitucional (PEC 38). “Se a reforma administrativa for aprovada, além do desmonte da educação pública, vai destruir todo o serviço público no Brasil. É um ataque ao SUS (Sistema Único de Saúde), é um ataque ao SUAS (Sistema Único de Assistência Social) e demais setores do serviço público representando um enorme retrocesso e inviabilizando os avanços que estamos aqui debatendo e construindo”, registrou a professora Ivonete Cruz.
Texto e foto Iracema Corso
